Quase, quase formando e virando jornalista COM DIPLOMA!
Pois é, ta quase, quase!
Eu já fiz um post sobre meu TCC, pra quem não leu, leia agora! =).
Foi realizado uma reportagem impressa, no formato de uma revista, com aproximadamente 45 páginas. O tema é o Parque da Juventude, que antigamente era o Carandiru. [CASA DE DETENÇÃO]
Pois bem, todo lugar tem uma história e toda pessoa tem um passado. Juntando isso, e para contar como era os tempos de detenção, entrevistamos um ex-detento, hoje homem regenerado, pai de família, trabalhador, mas que prefere manter sua identidade em sígilo por questões pessoais, que conta tudo abertamente.
A entrevista aconteceu no Parque da Juventude, e foi quando o ex-detento voltou ao local do qual ele passou anos de sua vida, pela primeira vez, foi emocionante!!!!

Então abaixo segue a entrevista na íntegra com ele, cujo batizei de José Augusto, sem nenhum motivo específico.

José Augusto (nome fictício)
Cumpriu 10 anos de pena
4 anos no Carandiru ( os outros seis foram em outras unidades)
Preso por furto e roubo de carros
Preso em 23 de outubro de 96 e saiu no dia 12 de março de 2003


O ex-detento José Augusto cumpriu mais de 10 anos preso. Quatro deles, foram no Carandiru, os outros seis foram em outras unidades.
- “ fui preso por furto e roubo de carro”
José foi preso em 23 de outubro de 1996 no estado de Minas Gerais, e conta que desde o começo teve apoio incondicional de sua família, que fazia questão de visitá-lo sempre que possível, inclusive para levar alimentos e produtos de higiene pessoal.
- “Eles me acompanharam em todas as unidades que eu passei, até no último que eu fui posto em liberdade do Instituto Penal Agrícola de Bauru, lá também eles foram me visitar.”
O ex-detento relembra que quando chegou ao Carandiru o que mais impressionou foi o tamanho do local. José garante que não sentiu medo em cumprir a pena no Carandiru, mas que os familiares ficaram preocupados.
“ Quando abre assim os portões e os próprios funcionários falam assim “bem vindo ao Carandiru”, eles tentam passar um sentimento de medo. Mas pra mim... eu já tava preso mesmo... num ia fazer diferença nenhuma, pelo contrário, eu ia ter até um pouco mais de espaço.”

José ganhou sua liberdade definitiva no dia 12 de março de 2003, deixando para trás toda a bagagem e envolvimento com a vida bandida. Hoje, pai de família e homem honesto e trabalhador, acredita que a cadeia não ajuda na regeneração do preso.
“A cadeia não regenera ninguém. Só o nosso sistema prisional que o Estado tem não é capaz de reeducar o preso. O que acontece... é... existe trabalho dentro da penitenciária, existe remuneração por este trabalho, mas assim, o trabalho é uma quantidade de trabalho muito além daquilo que o preso tem capacidade de fazer e a remuneração por este trabalho é mínima. Então já começa uma situação de humilhação aí.”

Pai de uma filha, José credita sua recuperação e a volta por cima, ao apoio continuo da família. Esse apoio foi fundamental!
No entanto, o ex-detento também pontua, que logo que deixou a detenção definitivamente, teve a oportunidade de trabalho.
“Quando eu saí eu tive oportunidade de trabalho, o que me ajudou muito. E hoje eu to bem empregado, né... to podendo sustentar minha família. E... aprendi a ser homem aqui dentro. A lição de vida me veio aqui de dentro. Lá fora, antes daqui, eu não dava muito valor à vida, eu era irresponsável, eu era inconseqüente, E assim, pra eu me manter vivo aqui dentro foi o que me ensinou a viver aqui fora.”

Mais de cinco anos após sua última estadia no então Carandiru, José acompanhado de sua esposa, volta ao local onde desperdiçou mais de quatros de sua vida, pela primeira vez.

Coincidentemente os pavilhões que se mantiveram – não foram implodidos - e hoje, funcionam as Escolas Técnicas do Centro Paula Sousa, são exatamente os mesmos que José ficou durante sua detenção.
Com muita emoção e muitas memórias, o ex-detento passeia pelo o que ele chama de Masmorra (pavilhão 7) - hoje a Escola Técnica Parque da Juventude - e acaba se confundindo e não identificando com clareza, afinal tudo foi reformado e adaptado para virar salas de aula.
“Aqui na Masmorra antigamente, no quarto andar, funcionava o hospital. Não chegava a ser o que a gente vê como hospital né, mas quem tava mal, quem tava internado, quem tava doente com tuberculose vinha pra cá. Por isso era ruim aqui, era muito frio, muito úmido, muito vento e pouca infra-estrutura, também, pra cuidar das pessoas que estavam doentes.”

No dia 02 de outubro de 1992, ocorreu o chamado “Massacre do Carandiru”, onde uma mega rebelião culminou na morte de 111 homens, – dados da polícia – 153 feridos e 130 pessoas detidas pela polícia. Os presos sobreviventes garantem que houve mais de 250 mortes no dia.
Nessa época José ainda não figurava entre os detentos, mas contou que conversou com alguns sobreviventes do episódio, para saber como proceder caso houvesse alguma rebelião enquanto estivesse detido.
“Algumas pessoas falavam que eram sobreviventes do massacre e eu como não estava aqui na época gostava de saber, se futuramente acontecesse alguma coisa semelhante eu saberia até como sobreviver.Todos que sobreviveram disseram a mesma coisa: Se fingiram de mortos no meio dos cadáveres!. E acredito que pelo menos 60% dos vivos contraíram HIV no meio dos cadáveres. Infelizmente.”

O fato que ficou conhecido como o Massacre do Carandiru, teve início devido uma briga entre detentos do pavilhão nove, o maior pavilhão da casa de detenção. Nessa época, a casa sofria de super lotação, já chegando a oito mil detentos. Diversos motivos já foram dados para explicar a rebelião. As mais ouvidas são: briga por roupas no varal, uma partida de futebol e/ou guerra entre pavilhões.
A hipótese apresentada pelo livro 'Estação Carandiru', escrito pelo Dr. Dráuzio Varella, lançado no ano de 1999, no qual ele coleta depoimentos dos presos durante o funcionamento do presídio, e também pelo programa especial Globo Repórter, a causa teria sido por uma briga de roupas estendidas em varais.

Segundo jornalistas que colheram alguns testemunhos de ex-detentos e através de investigações sobre o caso, o motivo teria sido uma partida de futebol entre os detentos que eram encarregados da faxina contra os detentos que se responsabilizavam pela alimentação. Faxineiros x Cozinheiros do pavilhão 9, que utilizavam de facas artesanais, materiais cortantes, paus entre outros objetos, iniciando a rebelião.

Após um confronto inseparável, e por diversas tentativas furadas de negociação entre os presos e o diretor da Casa de Detenção, a tropa de choque, liderada pelo finado Coronel Ubiratan, invadiu, desrespeitando o acordo que estava sendo firmado. Portando armas automáticas e metralhadoras, impuseram a ordem e acabaram criando a pior história de rebelião em presídios já noticiada no país.

José relembra que durante uma das conversas sobre o massacre com os presos remanescentes, muitos contavam que a polícia entrou pra matar, sem dó nem piedade.
“Todas as pessoas que sobreviveram foram assim. Muitos já baleados também, porque a polícia entrou atirando em vivos e mortos, e muitos com marca de mordida de cachorro também. Mas os vivos sobreviveram assim, em meio aos mortos.”

Dos 153 acidentados no confronto, 23 eram da polícia. No entanto, nenhum policial morreu na operação.
Segundo dados fornecidos por investigações do Ministério Público e por reportagens, apenas 9 dos 111 mortos cumpriam pena longa, 80% dos detentos aguardavam julgamento e 51 homens mortos no massacre eram jovens com menos de 25 anos.

José relembra que depois da rebelião, o pavilhão 5 deixou de ser um local seguro. Ele explica que o sistema da casa de detenção era dividido em 3.
O que era denominado de Penitenciária 1 , era onde acoplava os pavilhões 4, 7 e 9, a Penitenciária 2, era os pavilhões 2, 5, e 8 e por fim a Penitenciária 3, que era exclusivamente o pavilhão 6.
Depois do massacre, tudo foi reorganizado, e então o pavilhão 5 passou a se chamar Raio 2. E sendo assim virou um pavilhão 'comum', sendo que antes costumava ser o pavilhão que separava os estupradores, os chamados cagueta (dedo-duro), os travestis, e pedófilos, dos demais presos. Foram todos transferidos e virou uma penitenciária comum.
Entre suspiros tensos, os ex-detento começa a compartilhar do episódio mais marcante de toda a sua passagem pelo Carandiru. No caso, ele se encontrava na cela de castigo do pavilhão 5, isolado dos demais, numa manhã comum, ele concentrado fazendo a barba, se deparou com um silêncio repentino. José explica que na cadeia, o silêncio é sinal de problema.
“Quando tava quieto demais alguma coisa tava acontecendo. E quando veio aquele silêncio eu olhei pelo guichê na porta e eu vi um rastro no chão assim de um pano húmido. Eu acompanhei aquele rastro e vi um corpo caído ali. E eu falei para o restante do pessoal da cela que tinha um corpo caído.
Os caras falaram assim: um corpo? Você tá louco? Não pode matar ninguém na cadeia! Tá em paz a cadeia!
E eu continuei afirmando: Mas tem um candango caído ali!
E o pessoal olhou, e realmente tinha um corpo caído ali. E o corpo ficou ali por 4 dias.
E o pessoal vinha, o pessoal da faxina, que eram os únicos que podiam entrar lá, e eles vinham trazer nossa alimentação e aquele cheiro de cadáver na galeria, e aquele cadáver ficou ali por 4 dias. Eu não sei por qual motivo ele ficou ali, porque eu tava trancado na cela, não tive acesso à informações, mas assim, você conviver com um corpo caído a 3 metros de você é uma situação no mínimo macabra, estranha. Não me assustou, mas me incomodou. Então eu acho que aquela impressão que mais me incomoda de todas as minhas lembranças é a lembrança daquela morte.”

José termina sua primeira visita, sentado em um dos bancos posicionados nas estruturas do Carandiru 2, no parque central. Com muita emoção, declara que se sente abençoado e aliviado de ter saído da detenção sem nenhuma marca de faca no corpo, nenhum machucado, intacto, pois havia muitas brigas lá dentro.
Procurando recuperar o tempo perdido, e uma vida honesta, José acredita que para qualquer ex-detento conseguir isso, depende primeiramente da força de vontade de cada um.
“O preso que sai e começa a ter uma vida honesta lá fora, ele teve em primeiro lugar opinião própria, e em segundo lugar, quando ele encontrou a rua definitivamente, ele teve apoio da família, dos amigos, ele teve um muro lá fora, um alicerce pra ele poder se sustentar quando sair e conseguir batalhar e vencer.”

O ex-detento avalia a idéia do parque como um gesto positivo e bem executado, e até promete virar frequentador e levar a filha e o cão da raça sheepdog, para um passeio em família.
E num tom sincero e emotivo finaliza a entrevista respondendo se prefere o parque ou a penitenciária.
”Hoje, na primeira visita aqui, eu conheci... encontrei coisas que não havia aqui na minha época, e os pavilhões que sobraram né, os três prédios que estão de pé aí e são as escolas técnicas, foram prédio que eu passei. Me emocionou um pouco, porque afinal de contas eu perdi anos da minha vida aqui.
Então, com certeza foi um projeto bom, porque nós tiramos daqui um lugar que só tinha histórias ruins, um lugar marcado por mortes e por massacres, e colocamos um lugar que vai trazer um pouco de alegria pra população. Mas eu acho que a penitenciária aqui trazia um pouco de conforto pras famílias, porque os parentes estavam próximos dela, o comércio local também podia ter um capital maior para poder girar, tinha um giro maior porque as pessoas iam comprar aqui pra trazer pros presos daqui.
Então assim, teve os prós e os contras, não dá pra dizer exatamente o que foi melhor, o parque ou a penitenciária. Pelo menos não há tantas mortes concentradas aqui como haviam antigamente.”
finaliza o ex-detento, José Augusto .


Mas toda essa história incrível só é um parênteses na matéria toda, que enfoca os benefícios que o parque trouxe.
Enfim,..

tá acabando!
TCC = Tem Coisa + Chata?
;)